domingo, 31 de maio de 2020

Vento Divino - 08

Jhun aguardou Nanami sair... em sua cabeça, ele tinha claro que Nanami apenas queria desculpas para estar certa. "Mulheres"... talvez ela nunca entendessem como homens eram cegos ou burros... ou as duas coisas. Alguns homens, como Jhun viviam apenas para o clã. Sua visão sobre o que acontecia aquém daquilo era muito opaca. Porém, como todo homem, ele demorava muito a perceber tudo o que estava acontecendo.

Quando Nanami saiu, ele deixou o seu sunomono e saiu atrás dela. Seguiu ela por um quarteirão ou dois depois da hospedaria, quando já estariam um pouco longe da mesma e então, ele chamou o seu nome.

Jhun: NANAMI!

Se ela não virasse ou não o ouvisse, ele aceleraria o passo e tocaria em sua mão... mesmo sob a ameaça de perder a mão... mas confiaria de tocar com delicadeza e sem desafiá-la... e de não estar na presença de outros. Mas tentaria conseguir a atenção dela...

Jhun: Nanami... eu não me despedi de você. Não importa o ódio ou desprezo que você esteja sentindo por mim por qualquer razão que seja, mas me deixe terminar...

Ele suspirou e continuou.

Jhun: Antes de toda missão, eu sempre penso se esta poderia ser a última... e você é o mais perto que eu tenho de uma família. Sempre antes de uma missão, meu primeiro e último pensamento é você. Porque você me criou como uma irmã... me ensinou muito do que sei... e cuidou de mim em muitas situações que outros não cuidariam.

Olhou nos olhos dela e disse.

Jhun: Eu nunca poderia falar isso na frente de outros... porque... porque você sabe o quanto qualquer tipo de sentimento nos nubla. Mas... se esta for a minha última missão e se eu morrer nela pelo nosso clã, não quero encontrar meu fim sem ter dito ao menos uma vez que... que eu a amo, Nanami... Não como irmã... mas como mulher e como o ser humano mais incrível que eu já conheci. E ver toda essa sua força... sua determinação... e saber que eu não seria capaz de protegê-la e cuidar de você... bem, talvez isso me amedronte. Isso e saber que, como fomos criados como irmãos, este sentimento nunca seria bem visto pelo nosso clã.

Ele esticou um dos braços e puxou um pouco a manga.

Jhun: Meu coração é seu, Nanami.... sempre foi. Mesmo que isso seja proibido... e minha mão também, se você ainda quiser cortá-la. Mas eu referia perder todos os membros do meu corpo a perecer em uma missão sem dizer a você o que sinto... ou sabendo que você nutre qualquer coisa ruim sobre mim. Você está certa... eu sou um idiota... um idiota por me deixar levar por um sentimento que nosso clã proibiria. Por favor... guarde esse meu segredo e leve o meu amor consigo. Ou faça o que quiser com ele.

Terminou com uma última olhada nos olhos dela e disse.

Jhun: Adeus... Nanami.

O jovem Shinobi decidiu arriscar tocar a Kunoichi mais uma vez, a despeito dos avisos anteriores da moça. Contudo, ele encontrou pouca ou nenhuma resistência dessa vez. Nanami reduziu o passo rapidamente ao toque de Jhun, e quando se virou, o shinobi viu que os olhos muito verdes da moça agora estavam quase azuis, tomados pelas lágrimas que escorriam pela face da morena até pingar do queixinho.

Ao invés da esperada reação violenta, Nanami supreendeu Jhun, e se aproximou do rapaz, recostando a cabeça dela sobre o peito dele, escondendo o rosto da visão do jovem, assim como suas lágrimas. Jhun fica sem reação. A jovem Kunoichi sente os braços do rapaz tremerem quando ele a abraçou, tentando confortá-la.

Ela ouviu pacientemente tudo o que o Shinobi tinha para dizer, sem levantar o rosto para encará-lo. Talvez para não permitir que ele a visse chorar em seus braços. Mas, quando Jhun verbalizou a sua declaração, Nanami o empurrou instintivamente, se afastando dois passos, como se tivesse sido golpeada. Por vários segundos, ela apenas abriu e fechou a boca, como se não conseguisse decidir o que falar, com os olhos agora claros como a água do rio arregalados em choque.

Até que, após alguns momentos de reflexão silenciosa e batalha interna, a moça parece se decidir e fecha o semblante. E o Shinobi consegue enxergar a indignação nos olhos da morena.

-"Amor? Você me ama? Jhun, você nem ao menos tenta me compreender!"- ela bate o pezinho no chão, de forma adorável. Jhun sente o ímpeto de abraçá-la novamente, e dá um passo em direção à moça, mas é parado por uma firme e impiedosa mão espalmada, que o obriga a manter distância.

-"Eu não consigo te compreender, e acho que isso é o que há de belo em você. Você é um turbilhão. Um tsunami de emoções. Eu não compreendê-la não quer dizer que eu não tente, Nanami!- O jovem diz, com a inexperiência cobrando seu preço.

Os olhos de Nanami se escurecem conforme as lágrimas secam e dão lugar à fúria esmeralda. Ela lembra bem de como se sentiu insultada na hospedaria a troco de absolutamente nada.

-"Você me rebaixa. Me equipara a uma puta qualquer de esquina que usa o corpo pra chamar atenção. Que amor é esse, Jhun? Que julga? Que condena? Que inferioriza? Que amor é esse que não te permite me olhar nos olhos e ver algo além do meu corpo? O que eu fiz pra não merecer ser levada a sério? Desculpe por ter cometido o crime terrível de ser uma mulher bonita!"- A fúria nas palavras da morena é crescente. A frieza na voz da moça cresce a cada sílaba que ela profere, carregada de mágoas antigas das quais agora Jhun tornara-se o avatar.

-"EU? Nanami... Eu sou o único que a enxerga além disso! Quando pedi que você se vestisse foi porque eu sei que os outros te enxergam como nada além disso. Não, você não tem culpa da sua beleza, nunca terá. Eu... eu não consigo me fazer compreender por você. Eu olho você nos olhos, e sabe o que vejo?- o Shinobi sente os olhos arderem e começa a ele próprio a conter suas lágrimas agora. -"Vejo a pessoa que quando cheguei na vila, após meus pais serem mortos, seu avô disse para cuidar de mim. A pessoa que me pegou pela mão, me alimentou. Me mostrou onde dormir. E, quando eu tinha pesadelos, eu podia ver a sua sombra por trás da sua porta, zelando por mim. Eu vejo a pessoa que se preocupava. Eu não sei quando comecei a te amar, Nanami. Mas com certeza não foi pelo seu corpo ou seus olhos. Eu aprendi a amá-la pelo seu espírito, força... e vontade de fazer o bem."- Jhun desviou o olhar da moça. -"Me perdoe se meu sentimento a ofende. Mas ele é sincero. Ele talvez seja a coisa mais sincera que você já teve na vida."

Nanami se sentiu estapeada. Jhun continuava com sua sessão de julgamentos, pré-conceitos e pressuposições acerca das intenções de outras pessoas. Ela deus mais dois passos para trás, abrindo os braços de forma irônica enquanto falava com a voz em uma risada de raiva e indignação.

-"Um tanto pior! Adivinha só, Jhun? Eu não preciso de proteção. Eu não fiquei bonita ontem, sabe? Eu convivo com a minha beleza a anos. E não sou estúpida. Eu sei quando um homem me deseja. Eu sei que todos eles me desejam. E sei me cuidar. Não vou deixar de fazer as coisas que gosto de fazer e nem de ser quem eu sou porque vocês não conseguem conter suas ereções infantis! E, se você me ama, deveria me compreender e cuidar de mim. E não me maltratar e me culpar pelas atitudes de outros!"- Ela apontou o dedo acusador para Jhun enquanto falava, e novamente bateu o pé no chão, pontuando as sentenças que ela julgava que precisavam de maior ênfase ou que a deixavam particularmente indignada.

-"Eu sei que você não precisa de proteção. Mas o que posso fazer? É minha natureza proteger os que amo! Eu não posso fazer nada contra isso... e eu compreendo você sim. Droga, Nanami! Eu falo e você não me escuta! Você sabe o quanto eu admiro e respeito seu jeito e sua forma de ser, eu compreendo! Eu... eu não tenho como argumentar com você. Desde que nos conhecemos, você sempre esteve certa. As suas palavras podem ser duras, mas as suas lágrimas não mentem. Eu posso sim ser o idiota que você diz, e você pode me distanciar como você fez. Mas isso não vai mudar as coisas. No fim, um de nós abriu o coração, e outro não. O destino vai se encarregar de dizer quem estava certo."- E então o shinobi ergue o papel que o convocava ao dever, mostrando-o para a moça. -"Eu não sei se voltarei dessa missão com vida, Nanami.. mas deixo aqui com você o meu amor. Você decide o que fazer com ele."- Jhun se afastava mais dois passos da moça. A distância entre ambos era cada vez maior.

Nanami abraça a si mesma e desvia o olhar, como se estivesse insegura de suas próprias respostas. Ela fala com amargura e com tristeza na voz.

-"Palavras, Jhun. São vento. O que você fala é diferente do que você faz. De como age. Você não me ama, Jhun. Como seria possível? Você nem ao menos tenta me entender. Você apenas me deseja, como todos os outros. E está tudo bem, eu posso entender. Mas por favor, apenas me respeite."- a voz da moça falhava enquanto ela dizia essas últimas palavras, e os olhos novamente se clarearam quando ela não pôde segurar mais uma lágrima.

Agora foi a vez de Jhun se sentir estapeado. Ele levanta o rosto, com os olhos marejados.

-"Como pode dizer isso? Assim... como pode?"- a voz do Shinobi então fica dura e rígida. -"Tem razão, Nanami. Eu apenas a desejo. Você não é nada além de um corpo belo."-- Não havia qualquer tom de sinceridade na voz dele, apenas de concordância. Como quem acha que brigar mais apenas aumentaria a mágoa entre ambos. Se era aquilo que era queria ouvir, ele lhe diria aquilo. Porque o amor que sentia por ela era maior do que a vontade de tentar convencê-la de algo.

-"Me desculpe pelas minhas idiotices. Espero que nos vejamos de novo, nessa ou em outra vida."- Ele passou por ela, e quando estava ao lado dela, parou. Timidamente, as pontas de seus dedos tocaram os dedos dela, como se quisesse sentir uma última vez aquele toque macio. Mas a Tigresa da Montanha sabia ser implacável, e cruzou os braços. E disse, mesmo engasgando de tristeza ao segurar as lágrimas que queriam voltar a jorrar:
-"Adeus, Jhun. Você vai ficar bem."-
e então ambos viram as costas um pro outro, e caminham em direções opostas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Ultima Postagem

Vento Divino - 09

Com a resposta de Nanami, Jhun apenas a observou indo embora... quando ela sumiu na multidão, ele disse em tom quase inaudível. Jhun: Adeus,...

Mais Visualizadas