quarta-feira, 3 de junho de 2020

Vento Divino - 09

Com a resposta de Nanami, Jhun apenas a observou indo embora... quando ela sumiu na multidão, ele disse em tom quase inaudível.

Jhun: Adeus, Nanami...

Aquele seria o fim derradeiro da história mal começada dos dois? Ele não sabia dizer... e nem conseguia entender as palavras e os sentimentos da Tigresa da Montanha. Ele então seguiu o seu caminho.
Antes de ir, ele parou em uma loja de peixes e comprou 4 pequenos baiacus.... cortou-os ali mesmo no balcão e extraiu o seu veneno para um frasco que carregava. Jhun não precisava comprar muita coisa, pois ainda tinha os equipamentos da missão. A Ninja-to estava envolta em um pano junto com a Wakisashi, ocultas como se fossem pedaçoes de bambu carregados por um viajante, assim como o arco e as flechas ocultos no mesmo.

Jhun tomaria uma diligência para a cidade de sua missão a encontrar o seu contato. Queria sair logo dali e chegar o mais rápido possível onde deveria estar. Não demorou muito... comprou ração para os dias de viagem, encheu seu cantil em alguma fonte da cidade e deu 2 moedas para um desafortunado na rua, pois ele se lembrava como era ser um coitado e que nem todo homem é responsável pelo que o destino o concede.

Nao passou novamente na estalagem, pois não queria arriscar-se a cruzar com Nanami de novo.... apenas seguiu o seu caminho, mas não conseguiu tirá-la de seu pensamento e o turbilhão de emoções que ela tinha e que ele não conseguia entender.

Talvez fosse aquilo mesmo.... um reles idiota. Mas ainda era um idiota extremamente mortal.

Os 534 quilômetros que separam Edo de Kyoto através da Nakasendo sempre foram um tradicional e severo obstáculo para os viajantes, que enfrentam curvas estreitas e pontes discutíveis por entre as montanhas. Porém, o viajante cansado é compensado pelas paisagens de tirar o fôlego, com folhas em uma explosão de cobre e vermelho colorindo os vales abaixo dos picos eternamente nevados, e pela brisa perfumada de caquis da montanha, postos pelos comerciantes para secar ao sol. Com os caquis secos, é feito um doce tradicional, recheado com nozes e coberto de açúcar, iguaria que atrai muitos dos peregrinos que precisam descansar os pés doloridos nas inúmeras ryokan¹ que existem no caminho.

Jhun era um rapaz vigoroso, no auge de sua forma física e excelente treinamento. As subidas e desníveis, mesmo da Nakasendo, seriam um desafio pobre ao vigor do rapaz. Mas, como o tempo urge, Jhun decidiu não economizar e tomou lugar em uma diligência rumo à capital imperial. Os outros passageiros (eram sete, no total) tinham boa aparência, e suas vestes sugeriam que eram todos de certo grau social, provavelmente comerciantes de sucesso ou mesmo nobres de baixa estirpe. Conversavam entre si com palavras articuladas em um sotaque característico de Kyoto. O tema era sempre amenidades. Uma viagem longa entediante a um homem de ação. O bambolejar da carruagem prosseguia constantemente por trechos de até quatro horas, quando o cocheiro parava em casas de chá para que os passageiros pudessem esticar as pernas, ir ao toalete e comer alguma coisa. Logo, a luz do sol começou a esmorecer conforme ele se deitava atrás das montanhas, e o cocheiro anunciou que passariam a noite em uma hospedaria à beira da estrada. Haviam opções, mas ele recomendava que ficassem na Hyoka-ya, que pertencia a uma família de confiança.

O lugar era uma cidadezinha pacata à beira da estrada, onde os nativos da região ofereciam seus produtos aos viajantes por preços atraentes. A hospedagem tinha um preço razoavelmente alto, mas que estava dentro do orçamento de Jhun, caso não houvessem contratempos até chegar na cidade. Ele também poderia optar em ficar em alguma hospedagem mais barata, com menos conforto.

Jhun passou o caminho quase todo em silêncio.... tirou um tempo para si em uma silenciosa reflexão sobre o que se passou com Nanami e pensou que, talvez, fosse melhor que o destino os separasse daquela maneira do que de maneira mais drástica, como um ensanguentado nos braços do outro. Era triste, mas era a realidade...

Ele não pôde deixar de pensar nos lábios carmim da moça quando viu o céu ou no perfume dela quando sentiu o cheiros dos caquis, porém, tentou tirá-la da cabeça como um estalajadeiro expulsa um bêbado o tanto quanto pôde... era meio impossível, mas não era crime tentar.

Durante a viagem na carruagem, Jhun manteve-se com a cabeça baixa e uma mão sempre na kunai escondida, como quem esconde uma dor de barriga... Isso porquê ele não sabia se teria inimigos ou engraçadinhos durante a viagem, mas ela mostrou-se calma e provou que o jovem era um pouco mais paranóico do que o normal. Durante todo o trajeto, ele só foi uma vez ao banheiro, mas não frequentou as casas de chá. Ficou hidratando-se com a própria água que trouxe em seu cantil, que recarregou em uma fonte na última cidade.

Quando chegou, o cocheiro indicou uma estalagem que parecia ser um pouco mais cara, porém, mais confortável.... Jhun preferiu uma estalagem mais simples e em conta. O jovem Shinobi não precisava de luxo e uma estalagem mais simples chamava menos atenção. Então ele foi até uma estalagem mais barata, cumprimentou o atendente e deixou algumas moedas no balcão... o suficiente por uma cama e uma refeição. Queria comer carne e arroz naquela noite.... a carne daria energia para ele, por conta da proteína e o arroz o daria a sensação de saciado.... pediu também um pouco de água e um copo de saquê para esquecer Nanami naquela noite.

Então, foi para o seu quarto e colocou a "segurança padrão" improvisada.... uma garrafa de vidro apoiada na porta e uma na janela, onde ambas quebrariam caso um dos dois locais fosse aberto. Deitou-se no colchão com os braços por trás da cabeça e ficou olhando para o teto e pensando no que deveria fazer... até ormir... ou que outra coisa acontecesse...

terça-feira, 2 de junho de 2020

A menina de Dança - 09

Após tomar mais um banho e preparar o café da manhã, Suzuka ainda estava repleta de pensamentos conflitantes sobre a noite anterior. Não sabia se deveria sentir alívio por ter sido salva, vergonha pela humilhação sofrida, raiva pela sua impotência, medo ou admiração pelo seu salvador... o misto de sentimentos e sensações pesava no peito da Geisha, tornando a respiração pesada. Sentia como se algo ardesse em chamas em seu abdome, como se o ar lhe faltasse, como se sua alma sangrasse. Queria chorar de novo, mas as lágrimas não vinham. Decidiu tocar seu Shamisen em busca de conforto. Talvez as notas adocicadas do instrumento tivessem o poder de transportar-lhe para paisagens mais floridas. O pensamento em sua mãe lhe trouxe alívio, até as batidas em sua porta.

Ainda estava em roupas de baixo, então não abriu a porta. Apenas perguntou quem era. Ouviu uma voz grossa e firme responder a sua pergunta, e sentiu um frio na espinha ao ouvir a palavra "Shinsengumi". Os Lobos de Mibu farejaram o cheiro do sangue, e agora estavam a sua porta. Devia ficar feliz? aliviada? Mas sentiu medo. Porque? Era uma vítima. O Shinsengumi era proteção, era segurança. Mas sentiu o peito apertar. Não queria abrir a porta, não queria ver aqueles homens. Porque se sentia assim?

O sorriso triste de Gensai lhe veio a mente. Ela queria protegê-lo? O assassino brutal que matara três homens ontem a noite, dois na sua frente. Mesmo assim, lhe era grata. Não pensava mais no ódio por trás dos olhos furiosos do samurais, mas apenas na ternura em sua voz. E o pensamento de que o Shinsengumi poderia usá-la para pôr fim a vida de Gensai deu-lhe um nó no estômago. Suzuka apertou os polegares em resignação. Assim como ele a havia protegido ontem, ela o protegeria hoje.

Entreabriu a porta para que pudesse ver os homens, e esses pudessem ver seu rosto. Ambos usam o uniforme azul celeste com detalhes em branco, com a faixa na cabeça que traz o ideograma para "Lealdade". Ambos carregam espadas na cintura. Um dos homens é baixo e careca, com braços musculosos e constituição sólida. Uma vigorosa barba enfeita seu rosto sorridente. O outro, também com um sorriso no rosto, mas mais felino, é alto e tem o cabelo penteado para trás e preso num coque, e mesmo assim mantém uma franja de aspecto esquisito, embora não seja um homem feio. Ele tem a constituição menor que a de seu parceiro, mas sua presença é bem mais poderosa. Os olhos do homem são impressionantes. Olhos de lobo. Penetrantes. Poderosos.

Em tom cordial, ele se apresenta como Hajime Saito, Capitão da Terceira Divisão do Shinsengumi. E diz que tem algumas perguntas que gostaria de fazer.

Suzuka sorri e acena com as mãos pedindo desculpas. Diz que não está decente, e pergunta se os samurais poderiam esperar um pouco. O careca fica levemente corado, e tosse sem graça. Mas Saito apenas sorri e pede desculpas pela intromissão. Ele a deixa se vestir. Suzuka rapidamente olha para os objetos sobre a mesa: uma pequena espada e a carta que Gensai havia deixado sobre o corpo de sua vítima. Ela toma algum tempo para guardar os objetos longe dos olhos de seus visitantes, e então pede-lhes para entrar e se sentar junto ao kotatsu¹ enquanto ela lhes serve um chá. Ambos agradecem a cortesia da geisha com uma reverência e tiram os sapatos ao entrar na casa de Ohgo.

Após todos estarem acomodados e servidos, Suzuka senta-se com eles junto ao kotatsu, e ouve Saito dizer-lhe que houve um incidente próximo à casa de chá onde a Geisha trabalha. Um assassinato triplo. Eles sabem que a jovem é uma geisha popular na casa de chá, e gostariam de saber se ela tem alguma informação. Suzuka sente as entranhas congelarem, mas seus anos de treinamento lhe permitem esconder bem seus sentimentos. Ela sente que os homens do Shinsengumi sabem mais do que revelam, e que existe suspeita por baixo da máscara de cortesia.

A gueisha pisca os olhos de longos cílios e sorri, baixando os olhos para seu copo de chá.

-"Senhores, não sei do que estão falando. Ontem estava indisposta e não fui trabalhar, assim como não irei hoje. Porém, mesmo que soubesse de algo, não poderia dizer-lhes, pois a discrição é o fundamento principal do meu trabalho. O que acontece nas casas de chá, não sai de suas portas."- ela diz, para em seguida dar um gole rápido em seu chá Jokisen.

Saito retira de seu quimono um calhamaço de papéis, que lê em silêncio. Os olhos dele cruzam os de Suzuka, que imediatamente sente sua pele se arrepiar. Ele pergunta se a moça esteve em casa o tempo inteiro durante a noite anterior, então.

A jovem geisha começa a sentir medo dos dois, com sua intuição gritando-lhe para tomar cuidado. De forma convicta, ela olha para os homens e mente, confirmando com a cabeça que sim, permanecera em casa.

Saito sorri, e pergunta se a moça lhe faria a gentileza de mostrar-lhe as mãos. De forma hesitante, e sem entender a razão do pedido, Suzuka estica as mãos. Ele agradece gentilmente a toma-lhe as mãos com delicadeza. As mãos de Saito são fortes, grandes e ásperas, mas ainda assim seu toque é delicado e gentil. Ele desliza a ponta dos dedos pelas palmas das mãos de Suzuka, primeiro abaixo do polegar, e então abaixo dos dedos mínimo e anelar.

Ele fica sério por um momento no qual parece refletir. E então troca olhares tensos com seu parceiro. Suzuka sente a preocupação se revirar em seu estômago, mas Saito lhe sorri e solta as mãos com a mesma gentileza que as havia tomado.

-"Você tem belas mãos, Ohgo-dono. São macias como apenas as de uma boa geisha poderiam ser."- ele faz uma reverência, e se levanta. Seu parceiro se levanta junto dele. -"Já sabemos tudo o que precisamos. Desculpe incomodá-la Ohgo-dono. Caso lembre de mais detalhes, por favor, procure a sede do Shinsengumi."- e vai junto com seu parceiro até a porta, onde levam alguns momentos para calçar suas sandálias.

Suzuka os leva até a porta, mas está inquieta. Ela sente nos homens do Shinsengumi um comportamento predador. Ela lembra do homem na noite anterior, e isso a deixa irriquieta. Não permitia-se confiar no Shinsengumi.

Antes de sair, contudo, Saito se vira, ainda com um sorriso no rosto. Mas esse Suzuka é capaz de perceber imediatamente a falsidade, como se o homem duelasse consigo mesmo ao pronunciar cada uma das palavras que disse:

-"Uma última colocação, Ohgo-dono. O nome do falecido nas portas da casa de chá era Shiori Kousuke-dono. Era um jovem mercador de apenas vinte e cinco anos. Ele deixou viúva sua esposa grávida de seis meses, assim como um filho de apenas cinco anos. A família pretendia se mudar para Edo no próximo mês, fazendo planos para o bebê vindouro. Uma terrível tragédia, a senhorita não concorda?".

A geisha balançou a cabeça, concordando. no fundo havia se comovido com a história, mas achava que Saito estava feliz com a situação, como um sádico. Não confiaria no Lobo de Mibu.

O olhar de Saito mudou quando seus olhos se cruzaram mais uma vez. Estavam mais frios. O sorriso deixou seu rosto.

-"O mal prospera quando as pessoas se calam e se omitem."-O Capitão da Terceira Divisão mantém os penetrantes olhos de lobo fixos nos olhos de Suzuka. E então, após um momento tenso, ele volta a sorrir. -"Mas, tomamos muito do seu tempo. Lamento muitíssimo. Por favor, aproveite o resto do seu tempo livre."

A frase "aproveite o resto de seu tempo livre" pairou um pouco no ar. Uma ameaça? Suzuka tinha ficado paranóica em relação a Shinsengumi, mas os rumores sobre Hajime Saito eram graves e sombrios. Era um homem justo, porém severo.

Assim, os homens viram as costas e vão embora, deixando Suzuka sozinha e preocupando-se com seus próximos passos.



¹- Mesa baixa de madeira, sob a qual há um braseiro. Geralmente, mas nem sempre, a mesa é ladeada por futons. Muito usado em períodos frios no Japão, uma forma graciosa de receber visitas.

²- Chá de alto teor de cafeína, muito popular na época.

segunda-feira, 1 de junho de 2020

Sobre Cães e Lobos - 09






“AS PESSOAS SÓ IRÃO ENTENDER UMAS ÀS OUTRAS QUANDO SENTIREM A MESMA DOR”


Apesar do receio de ter seu segredo revelado, ela e Yamada nunca tiveram uma conversa profunda como aquela. Talvez ele não fosse tão babaca quanto ela pensava, mas ele só estava falando tudo aquilo por estar extremamente bêbado.

Quando estavam sentados conversando a menina tinha em sentimento de igualdade. Naquele momento não era menosprezada por ser mulher e nem pela maneira que pensava.

Akemi levou um susto quando Yamada se ergueu de repente e corou ao encarar sua nudez. Mas ficou olhando seu rosto, já que ele falava tão empolgado. Chegou até sorrir com aquelas falas entusiástica.

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Mas o rapaz vomitou de repente e caiu deitado de bruços. Ela olha o estado lamentável que o homem estava por conta da bebida.

- Aisshhh….. - Disse amuada

Ela rapidamente enrola a toalha ao redor do corpo e sai da banheira, evita pisar no vômito e se aproxima do rapaz. Ele tinha desmaiado, iria avaliar se não havia nenhum ferimento. Se estivesse tudo bem com ele. A gatora iria para ante-sala se trocar e prenderia o cabelo num coque.

Ela volta para o banheiro com panos de limpeza e um roupão, que joga sobre o corpo do rapaz.

- Hey...Yamada, acorda…. - Cutuca o rapaz no ombro

Se ele não reagisse iria até o dormitório pedir ajuda, alguém teria que carregá-lo para a cama. Mas iria falar com os companheiros para serem discretos, afinal ninguém do pelotão iria querer ser punido pelo Capitão Harada.

Depois voltaria para limpar o vômito e esvaziar a banheira. Ela limpou no modo automático, pois já estava acostumada a fazer tarefas domésticas.

Já deveria estar amanhecendo, mas antes de deitar foi checar se Yamada está bem. Se ele tivesse dormindo deixaria descansando. Cansada Akemi iria procurar sua cama, talvez conseguisse cochilar por algumas horas.

Sons, Gostos e Cheiros - 09

-"Senhor, se o senhor falar rápido, eu não entender"- A moça parecia ter feito um esforço sincero para entender as palavras de Clement, aceleradas pela empolgação. Porém, no meio das perguntas, ela pareceu se perder completamente e passou a não entender nada. Ele mesmo parecia ter percebido que estava sendo confuso, mas a moça apenas sorriu. Uma gargalhada adorável. Clement sentiu que fazia anos que não ouvia uma mulher rir.

Os meses que havia passado no navio, havia passado na companhia apenas de homens. Mulheres dão azar em navios era como os marinheiros justificavam a ausência feminina no convés. De qualquer forma, a marinhagem era um trabalho árduo. O próprio Clement, que era mais passageiro do que tripulante, foi obrigado mais de uma vez a puxar cordas pesadas, rolar barris, carregar sacas de grãos... era um trabalho sacrificante. Clement imaginou que mesmo que fossem aceitas no navio, mulheres estariam fadadas ao serviço na cozinha. Mesmo o serviço de limpeza seria pesado e perigoso demais para elas.

Quando finalmente alcançaram a costa japonesa e lançaram âncora, a dias atrás, Clement descobriu que as nativas eram quase sempre muito sérias e sorriam apenas discretamente. Os japoneses eram um povo disciplinado, contido e discreto, em sua larga maioria. Nunca havia visto uma mulher japonesa dar demonstrações vívidas de alegria. E ao ver e ouvir Hana sorrindo e gargalhando na praia sob o sol, sentiu que uma de suas missões naquela terra distante, mesmo que uma das pequenas, havia sido atingida.

-"Já sei! Vamos até o res.tau.ran.te onde eu trabalho. Vou cozinhar algo gostoso para o senhor, como agradecimento. Comida japonesa."

"Que ótima ideia, entretanto não seria um problema um gaijin entrar no restaurante da sua familia ? É claro que nao me faltará modos, de maneira alguma, mas as vezes não somos bem recebidos. Vocês tem chá la ? Eu adoro chás.".
Colocando o chapéu sobre seu cabelo bem penteado novamente, ele faz um singelo gesto de companhia para que ela segure seu braço
" -Então, mostre-me o caminho"
Devolvendo finalmente aquele grande sorriso que mais cedo o surpreendeu, não era facil achar alguém que o fizesse perceber tais coisas mas essa moça tinha um grande livro em sua aura, e com certeza Clement estava curioso para lê-lo.
"A senhorita tambem poderia me mostrar alguma comida que eu possa comer sem ... Estar tão cru?" E com uma gargalhada ele espera seu aperto no braço para continuarem.

Ao ouvir Clement dizer que aceitaria ir para a casa dela, Hana ficou corada como um tomate. Uma mulher convidar um homem para a própria casa, no Japão, era um ato obsceno. Talvez ela tenha cometido um erro terrível ao tentar falar um idioma que não conhecia bem.

A moça se constrangeu e gaguejou, tentando explicar a Clement que havia cometido um engano, mas estava tão envergonhada que poderia chorar. Soltou uma enxurrada de palavras em japonês, em uma velocidade que Clement não tinha a menor esperança de compreender. A moça tinha medo do que o rapaz poderia pensar dela. Poderia achar que ela era uma qualquer, se oferecendo pra ele.

Mas logo a jovem se lembrou que estava conversando com um estrangeiro, e que as barreiras linguísticas e culturais que os separavam eram grandes. Acalmou-se, mas achou melhor esclarecer o mal-entendido de qualquer forma. Sorria de forma encabulada, e ainda tinha a face rosada pela vergonha quando lhe pediu desculpas e esclareceu tudo da melhor forma que pôde.

Quando o mal-entendido fora resolvido, retomaram sua caminhada pelo cais. Hana sorriu quando Clement lhe ofereceu o braço, e pegou seu braço de forma tímida. O toque da moça era delicado, e ela tinha mãos tão pequenas que Clement ficou parecendo um gigante ao seu lado. Conversaram sobre amenidades enquanto caminhavam ilha adentro. A jovem perguntara a Clement se ele gostava de frango. O rapaz sentiu uma fisgada no estômago quando imaginou a possibilidade de ser obrigado a comer frango cru, mas logo Hana gargalhou e lhe explicou que nem tudo o que comiam era cru, e que iria preparar Kaarage, que era um tipo de frango empanado e frito em óleo, com uma farinha e um tempero especial, preparados com sake, gengibre e especiarias. Ela disse que sabia que estrangeiros adoravam comida frita, e pensou que ele gostaria disso. Disse-lhe também que havia uma variedade de chás disponíveis para que ele apreciasse, e que ela recomendava-lhe expressamente que experimentasse o chá Oolong, especialidade da casa. Contou-lhe que era um chá que ficava entre o chá verde e o chá preto, mas que tinha o sabor mais parecido ao do verde, mas sem o gosto floral típico do chá verde.

A moça se sentia tão empolgada em falar e mostrar as coisas para Clement quanto Clement era empolgado em ouvir e conhecer coisas novas. Ambos descobriram ser uma companhia muito agradável ao outro, mesmo que tenham andado juntos por um caminho tão curto.

O restaurante onde a moça trabalhava não tinha nome na placa, como era costume dos restaurantes japoneses de Dejima. A placa de madeira entalhada que adornava a entrada discreta mostrava apenas uma flor de lótus roxa sobre fundo marrom, revelando um duvidoso senso estético de seu pintor. Clement esperava que Hana tivesse um senso artístico mais apurado do que o do entalhador da placa.

O lugar era pequeno. Apenas meia dúzia de mesas se espremiam em um espaço estreito que mais lembrava um corredor do que uma sala. Além de Hana, apenas outra moça vestida em trajes tradicionais japoneses servia as mesas. Não estava muito cheio, apenas uma das mesas estava ocupada.

Mas, o que chamou a atenção de Clement foi um velho piano de madeira, empoeirado num canto do restaurante. Parecia que ninguém mexia nele a séculos.

domingo, 31 de maio de 2020

Vento Divino - 08

Jhun aguardou Nanami sair... em sua cabeça, ele tinha claro que Nanami apenas queria desculpas para estar certa. "Mulheres"... talvez ela nunca entendessem como homens eram cegos ou burros... ou as duas coisas. Alguns homens, como Jhun viviam apenas para o clã. Sua visão sobre o que acontecia aquém daquilo era muito opaca. Porém, como todo homem, ele demorava muito a perceber tudo o que estava acontecendo.

Quando Nanami saiu, ele deixou o seu sunomono e saiu atrás dela. Seguiu ela por um quarteirão ou dois depois da hospedaria, quando já estariam um pouco longe da mesma e então, ele chamou o seu nome.

Jhun: NANAMI!

Se ela não virasse ou não o ouvisse, ele aceleraria o passo e tocaria em sua mão... mesmo sob a ameaça de perder a mão... mas confiaria de tocar com delicadeza e sem desafiá-la... e de não estar na presença de outros. Mas tentaria conseguir a atenção dela...

Jhun: Nanami... eu não me despedi de você. Não importa o ódio ou desprezo que você esteja sentindo por mim por qualquer razão que seja, mas me deixe terminar...

Ele suspirou e continuou.

Jhun: Antes de toda missão, eu sempre penso se esta poderia ser a última... e você é o mais perto que eu tenho de uma família. Sempre antes de uma missão, meu primeiro e último pensamento é você. Porque você me criou como uma irmã... me ensinou muito do que sei... e cuidou de mim em muitas situações que outros não cuidariam.

Olhou nos olhos dela e disse.

Jhun: Eu nunca poderia falar isso na frente de outros... porque... porque você sabe o quanto qualquer tipo de sentimento nos nubla. Mas... se esta for a minha última missão e se eu morrer nela pelo nosso clã, não quero encontrar meu fim sem ter dito ao menos uma vez que... que eu a amo, Nanami... Não como irmã... mas como mulher e como o ser humano mais incrível que eu já conheci. E ver toda essa sua força... sua determinação... e saber que eu não seria capaz de protegê-la e cuidar de você... bem, talvez isso me amedronte. Isso e saber que, como fomos criados como irmãos, este sentimento nunca seria bem visto pelo nosso clã.

Ele esticou um dos braços e puxou um pouco a manga.

Jhun: Meu coração é seu, Nanami.... sempre foi. Mesmo que isso seja proibido... e minha mão também, se você ainda quiser cortá-la. Mas eu referia perder todos os membros do meu corpo a perecer em uma missão sem dizer a você o que sinto... ou sabendo que você nutre qualquer coisa ruim sobre mim. Você está certa... eu sou um idiota... um idiota por me deixar levar por um sentimento que nosso clã proibiria. Por favor... guarde esse meu segredo e leve o meu amor consigo. Ou faça o que quiser com ele.

Terminou com uma última olhada nos olhos dela e disse.

Jhun: Adeus... Nanami.

O jovem Shinobi decidiu arriscar tocar a Kunoichi mais uma vez, a despeito dos avisos anteriores da moça. Contudo, ele encontrou pouca ou nenhuma resistência dessa vez. Nanami reduziu o passo rapidamente ao toque de Jhun, e quando se virou, o shinobi viu que os olhos muito verdes da moça agora estavam quase azuis, tomados pelas lágrimas que escorriam pela face da morena até pingar do queixinho.

Ao invés da esperada reação violenta, Nanami supreendeu Jhun, e se aproximou do rapaz, recostando a cabeça dela sobre o peito dele, escondendo o rosto da visão do jovem, assim como suas lágrimas. Jhun fica sem reação. A jovem Kunoichi sente os braços do rapaz tremerem quando ele a abraçou, tentando confortá-la.

Ela ouviu pacientemente tudo o que o Shinobi tinha para dizer, sem levantar o rosto para encará-lo. Talvez para não permitir que ele a visse chorar em seus braços. Mas, quando Jhun verbalizou a sua declaração, Nanami o empurrou instintivamente, se afastando dois passos, como se tivesse sido golpeada. Por vários segundos, ela apenas abriu e fechou a boca, como se não conseguisse decidir o que falar, com os olhos agora claros como a água do rio arregalados em choque.

Até que, após alguns momentos de reflexão silenciosa e batalha interna, a moça parece se decidir e fecha o semblante. E o Shinobi consegue enxergar a indignação nos olhos da morena.

-"Amor? Você me ama? Jhun, você nem ao menos tenta me compreender!"- ela bate o pezinho no chão, de forma adorável. Jhun sente o ímpeto de abraçá-la novamente, e dá um passo em direção à moça, mas é parado por uma firme e impiedosa mão espalmada, que o obriga a manter distância.

-"Eu não consigo te compreender, e acho que isso é o que há de belo em você. Você é um turbilhão. Um tsunami de emoções. Eu não compreendê-la não quer dizer que eu não tente, Nanami!- O jovem diz, com a inexperiência cobrando seu preço.

Os olhos de Nanami se escurecem conforme as lágrimas secam e dão lugar à fúria esmeralda. Ela lembra bem de como se sentiu insultada na hospedaria a troco de absolutamente nada.

-"Você me rebaixa. Me equipara a uma puta qualquer de esquina que usa o corpo pra chamar atenção. Que amor é esse, Jhun? Que julga? Que condena? Que inferioriza? Que amor é esse que não te permite me olhar nos olhos e ver algo além do meu corpo? O que eu fiz pra não merecer ser levada a sério? Desculpe por ter cometido o crime terrível de ser uma mulher bonita!"- A fúria nas palavras da morena é crescente. A frieza na voz da moça cresce a cada sílaba que ela profere, carregada de mágoas antigas das quais agora Jhun tornara-se o avatar.

-"EU? Nanami... Eu sou o único que a enxerga além disso! Quando pedi que você se vestisse foi porque eu sei que os outros te enxergam como nada além disso. Não, você não tem culpa da sua beleza, nunca terá. Eu... eu não consigo me fazer compreender por você. Eu olho você nos olhos, e sabe o que vejo?- o Shinobi sente os olhos arderem e começa a ele próprio a conter suas lágrimas agora. -"Vejo a pessoa que quando cheguei na vila, após meus pais serem mortos, seu avô disse para cuidar de mim. A pessoa que me pegou pela mão, me alimentou. Me mostrou onde dormir. E, quando eu tinha pesadelos, eu podia ver a sua sombra por trás da sua porta, zelando por mim. Eu vejo a pessoa que se preocupava. Eu não sei quando comecei a te amar, Nanami. Mas com certeza não foi pelo seu corpo ou seus olhos. Eu aprendi a amá-la pelo seu espírito, força... e vontade de fazer o bem."- Jhun desviou o olhar da moça. -"Me perdoe se meu sentimento a ofende. Mas ele é sincero. Ele talvez seja a coisa mais sincera que você já teve na vida."

Nanami se sentiu estapeada. Jhun continuava com sua sessão de julgamentos, pré-conceitos e pressuposições acerca das intenções de outras pessoas. Ela deus mais dois passos para trás, abrindo os braços de forma irônica enquanto falava com a voz em uma risada de raiva e indignação.

-"Um tanto pior! Adivinha só, Jhun? Eu não preciso de proteção. Eu não fiquei bonita ontem, sabe? Eu convivo com a minha beleza a anos. E não sou estúpida. Eu sei quando um homem me deseja. Eu sei que todos eles me desejam. E sei me cuidar. Não vou deixar de fazer as coisas que gosto de fazer e nem de ser quem eu sou porque vocês não conseguem conter suas ereções infantis! E, se você me ama, deveria me compreender e cuidar de mim. E não me maltratar e me culpar pelas atitudes de outros!"- Ela apontou o dedo acusador para Jhun enquanto falava, e novamente bateu o pé no chão, pontuando as sentenças que ela julgava que precisavam de maior ênfase ou que a deixavam particularmente indignada.

-"Eu sei que você não precisa de proteção. Mas o que posso fazer? É minha natureza proteger os que amo! Eu não posso fazer nada contra isso... e eu compreendo você sim. Droga, Nanami! Eu falo e você não me escuta! Você sabe o quanto eu admiro e respeito seu jeito e sua forma de ser, eu compreendo! Eu... eu não tenho como argumentar com você. Desde que nos conhecemos, você sempre esteve certa. As suas palavras podem ser duras, mas as suas lágrimas não mentem. Eu posso sim ser o idiota que você diz, e você pode me distanciar como você fez. Mas isso não vai mudar as coisas. No fim, um de nós abriu o coração, e outro não. O destino vai se encarregar de dizer quem estava certo."- E então o shinobi ergue o papel que o convocava ao dever, mostrando-o para a moça. -"Eu não sei se voltarei dessa missão com vida, Nanami.. mas deixo aqui com você o meu amor. Você decide o que fazer com ele."- Jhun se afastava mais dois passos da moça. A distância entre ambos era cada vez maior.

Nanami abraça a si mesma e desvia o olhar, como se estivesse insegura de suas próprias respostas. Ela fala com amargura e com tristeza na voz.

-"Palavras, Jhun. São vento. O que você fala é diferente do que você faz. De como age. Você não me ama, Jhun. Como seria possível? Você nem ao menos tenta me entender. Você apenas me deseja, como todos os outros. E está tudo bem, eu posso entender. Mas por favor, apenas me respeite."- a voz da moça falhava enquanto ela dizia essas últimas palavras, e os olhos novamente se clarearam quando ela não pôde segurar mais uma lágrima.

Agora foi a vez de Jhun se sentir estapeado. Ele levanta o rosto, com os olhos marejados.

-"Como pode dizer isso? Assim... como pode?"- a voz do Shinobi então fica dura e rígida. -"Tem razão, Nanami. Eu apenas a desejo. Você não é nada além de um corpo belo."-- Não havia qualquer tom de sinceridade na voz dele, apenas de concordância. Como quem acha que brigar mais apenas aumentaria a mágoa entre ambos. Se era aquilo que era queria ouvir, ele lhe diria aquilo. Porque o amor que sentia por ela era maior do que a vontade de tentar convencê-la de algo.

-"Me desculpe pelas minhas idiotices. Espero que nos vejamos de novo, nessa ou em outra vida."- Ele passou por ela, e quando estava ao lado dela, parou. Timidamente, as pontas de seus dedos tocaram os dedos dela, como se quisesse sentir uma última vez aquele toque macio. Mas a Tigresa da Montanha sabia ser implacável, e cruzou os braços. E disse, mesmo engasgando de tristeza ao segurar as lágrimas que queriam voltar a jorrar:
-"Adeus, Jhun. Você vai ficar bem."-
e então ambos viram as costas um pro outro, e caminham em direções opostas.

A menina que Dança - 08

O coração tem uma morte lenta. Perde-se a esperança como as árvores perdem as folhas, uma a uma. (Chiyo)




Na alvorada do dia, algumas pessoas passam apressadas nas ruas de Kyoto, o dia já havia começado para elas, pessoas sem rosto, sem nome e cada uma com suas historias e batalhas. Os primeiros pássaros já começavam a cantarolar nas janelas e arvores, avisando a todos que a noite dera o seu lugar para o dia,  o aroma dos chás sendo preparados perfumavam o ambiente, a cidade acordava. Mas no interior de uma simples casa, em uma esquina qualquer daquela cidade, encontrava-se uma pequena mulher, que teve seu coração e todo o seu ser destruído na noite interior, estava deitada e encolhida em posição fetal que se não fosse o suave respirar poderia acreditar que aquele corpo não tinha vida, afinal sua alma fora dilacerada. 





Depois de algumas horas  do amanhecer Suzuki despertou, seus pequenos olhos puxados abriram-se para o mundo e a mesma resolveu levanta-ser do seu futon. Ainda nua caminhou para o grande espelho que encontrava no seu quarto, que muitas vezes se trocava ali, ensaiava seus passos de dança, se maquiava se tornava a geisha que todos admiravam ali naquele espelho, mas hoje, naquela manhã, não reconhecia aquela mulher que a encarava, passou a mão em torno do seu corpo, acariciando cada pedaço do mesmo, tocando delicadamente em seus seios, na sua boca, na sua barriga.  Seu  corpo branco parecia a neve da sua cidade natal que por um instante foi quase tocado por alguém desconhecido e não merecedor de tal privilegio, seu cabelo comprido preto, cor da noite, caia sobre pelo seu corpo,  seu brilho, seu cheiro ... tudo era seu e fora tocado por alguém nojento e asqueroso. Tudo aquilo lhe pertencia, mas sentia que foi invadida e o bile daquela noite a deixava enojada e indefesa.





Caminhou para a cozinha e colocou a água para esquentar, precisava de outro banho, precisava se reencontrar. Enquanto a água esquentava Suzu preparava omelete e um chá Jokisen para seu café da manhã, estava sem apetite, mas precisava comer, precisava manter-se em pé. Após se alimentar pegou a água quente e jogou na banheira, jogou alguns sais minerais e pétalas de rosa, e entrou, ficou ali até a água esfriar, enrolo-se no seu kimono e seguiu para sua mesinha, penteou seu cabelo com sua escova dourada e toda desenhada a mão que ganhara de sua mão um pouco antes de saido de casa, escova que fora da sua bisavó, que fora da sua mãe e agora era tua, e naquele momento o sentimento de saudades tomou conta do seu coração, então Suzu fechou os seus olhos e se viu uma garotinha com os olhos vivos e alegres, sentada em um banquinho que não alcançava seus pezinhos no chão, e sua mãe tão doce e jovem penteava com todo carinho o cabelo daquela garotinha , cantando as mais belas canções, depois fazia duas tranças e prendia com fita de cetim vermelha e as duas iam passear nos campos verdes e ficavam caçando borboletas. Suzu sentia falta da sua mãe, da sua família, abriu a gaveta e pegou um papel de arroz, um pincel e um nanquim e escreveu para sua mãe e família, dizendo a todos o quanto sentia a falta de cada um, o quanto a cidade era bonita, como as arvores das cerejeiras enchiam os olhos de tanta beleza, o quanto se divertia nas casas de chá  e o quanto estava avançando no seu aprendizado. Mas não mencionou nada do que tivera acontecido com ela na noite anterior, não queria deixar seus pais preocupados e com sede de vingança. Precisava lidar com isso sozinha. 





Aquele dia não queria treinar, pois geralmente depois do café Suzu costumava treinar suas apresentações da noite, separava sua roupa, organizava sua casa, preparava seu almoço, meditava, estudava e se preparava para ir trabalhar, mas naquele dia não queria trabalhar, ainda não estava em condições de alegrar alguém, ouvir os problemas de alguém, sendo que ela mesmo estava destruída, era a própria tristeza encarnada. Mandaria um recado para casa de chá por um mensageiro dizendo que estava indisposta, ficaria ali no conforto da sua casa decidindo o que deveria fazer em relação a tudo que presenciou, em relação ao caráter do Gensai que na mesma noite mostrou um assassino a sangue frio e um herói de mocinhas indefesas, olhava para a espada e o bilhete ali na sua mesinha, há deixava na duvida e ao mesmo tempo criara um sentimento bom que nem mesmo ela conseguia entender. Não sabia se deveria procurar a policia, não sabia se seguiria a sua vida e manteria o ocorrido em segredo no seu intimo e deixasse a vida julgar e decidir por ela as pessoas envolvidas. Uma das lições que aprendera sendo geisha é o que se escuta no salão, fica no salão, que devemos ser discretas e guardadoras de segredo, então deveria guardar  o ocorrido da noite anterior, mesmo sendo uma cena criminosa? Suzu estava em conflitos, então naquela tarde tarde  decidiu meditar e tocar seu shamisen para dessa forma conseguir se reencontrar e decidir qual seria seus próximos passos. 


sábado, 30 de maio de 2020

Noite Carmim - 08

O homem olhou longamente Toshiro, enquanto o retalhador mantinha-se em silêncio. Até que ele suspirou e deu de ombros.

-"Silencioso, pra variar. Bom, suponho que tipos como você sejam de fato os melhores pro trabalho. Se anime, em breve teremos algo grande pra você."

E em seguida ele lançou um saco de moedas sobre a mesa, que continha o generoso soldo semanal de Toshiro. A quantia havia sido aumentada, "como retribuição aos bons serviços prestados", como o homem informou. O valor permitia a Toshiro ter os confortos esperados da classe dos samurais, mesmo que fosse uma situação rara hoje em dia.

Dois dias se passam, com Toshiro levando sua rotina de treinos adiante. Manter corpo e mente afiados era algo tão importante quanto manter aguçado o fio da espada.

Na falta de locais de treinamento discretos apropriados, Toshiro mantinha seus treinos físicos dentro da Hikari-ya, seja em seu quarto, seja no pequeno jardim de inverno que a pousada possuía nos fundos. Era um improviso que comprometia muito do desenvolvimento do treino, mas a ordem de manter a discrição impedia Toshiro de realizar sua rotina completa em locais públicos.

Quando Toshiro voltava para casa, após uma rotina de treinos particularmente puxada, decidiu tomar o caminho wue acompanhava o rio, por achar que a brisa abrandaria o calor do esforço e secaria-lhe as roupas molhadas de suor.

Foi quando notou Asami na rua principal. A jovem herdeira dos Hikari aparentemente estava em compras, e enfrentava dificuldades em carregar os pesados baldes de sal e missô. E negociava ferozmente com um comerciante na rua a respeito de uma saca de arroz.

Toshiro ao ver Asami Hikari trabalhando, com os baldes nos ombros, o suor escorrendo pela testa e as rodelas de umidade perto das axilas acredita que ela terá dificuldade para chegar em casa. Não que não chegue, certamente chegará. No entanto o bushido fala de compaixão e em ajudar aos outros. Estaria aquela negociação sendo mais demorada que o necessário?
      -- Asami-san, está negociando produtos de qualidade? Pediu um desconto para esse arroz? Toshiro sabia que qualquer comentário assustaria Asami pois a mesma não esperava encontrar com ele ali, nem mesmo que um samurai desse atenção para ela fora do ambiente de trabalho. Deveria Toshiro ajudar Asami com suas tarefas? Não parecia adequado, no entanto a negociação deveria ser adequada e rápida já que o mercador podia ver o desafio que sua cliente enfrentava para carregar a mercadoria. Para Toshiro havia compaixão com o próximo ao esclarecer para o mercador que deveria ser rápido em sua negociação para evitar o sofrimento de seus clientes.

       Ao olhar nos olhos de Asami-san as memórias de Toshiro o faziam se lembrar de que fazia muito tempo que não tinha uma mulher em seus braços.

-"Oh, Yamamoto-dono! Olá"- Asami sorriu ao ver Toshiro se aproximar, e o cumprimentou com uma breve reverência. A moça corou quando o samurai ofereceu-lhe assistência em suas tarefas, e agradeceu-lhe de forma hesitante, em clara dúvida sobre se seria apropriado aceitar ajuda de um homem de classe superior à dela. Porém, seus irmãos não puderam ajudar-lhe, e estaria em apuros para levar até a ryokan as pesadas compras que fizera. Sal e missô eram volumosos e pesados, e representariam um esforço excessivo à pequena Hikari Asami.

Finalizaram rapidamente as negociações. O comerciante se intimidou com a presença do samurai e forneceu um desconto maior à moça, que sorriu, feliz. Conversaram sobre amenidades no trajeto de retorno à pousada. Toshiro sentia as palmas da mão arderem conforme o cânhamo da corda -que era mais fino do que devia. a corda devia estar gasta e necessitando ser substituída- arranhava-lhe as palmas das mãos enquanto carregava os baldes de madeira que continha as pedras de sal e os fardos de missô. Sentiu que não eram tão pesados para seus braços fortes, mas que o peso aumentava conforme caminhavam e seus braços se cansavam. Pensou que era um excelente treino físico para seus braços e quadris. Chegou a se questionar silenciosamente se não deveria ajudar mais a moça. Era um treino decente e uma companhia agradável.

Quando se aproximaram do Ryokan viram o jovem Hikari Touda, irmão de Asami, conversando alegremente com uma moça. Estava explicado o atraso do rapaz em ajudar a irmã. Conforme se aproximaram, o rapaz percebeu Toshiro e Asami se aproximando e se despediu da moça, correndo em direção à irmã.

-"Onee-chan¹! Perdão! Eu já estava indo ao seu encontro, não precisava incomodar nosso hóspede! Sinto muito, Yamamoto-dono!"- o jovem pediu licença ao samurai antes de aliviar-lhe a carga, pegando para si os baldes enquanto agradecia e pedia desculpas ao mesmo tempo, fazendo uma série de reverências. Asami repreendeu o irmão severamente e pediu desculpas à Toshiro. Perguntou-lhe então se gostaria de tomar um chá, e se havia algo que poderia fazer em retribuição à ajuda prestada.

Porém, Toshiro sentiu sobre si os olhos de um transeunte. Olhou de soslaio, e viu que era observado por dois homens do outro lado da rua. Ambos samurais, já que carregavam katanas. Conversavam entre si e tinham os olhos fixos em Toshiro.


¹- Tratamento dado a irmãs mais velhas.

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